Friday, July 22, 2005

Lázaro

Todos vocês já morreram um pouco. Pensem bem. Quando morreu o vosso avô/avó, quando o/a vosso namorado/a vos deixou, quando perderam o/a melhor amigo/a. E o tempo curou essa morte parcial, aos poucos foi aliviando a dor dessas perdas. O tempo... Mas o que fazer quando sentimos que a nossa morte é total? No último instante de vida, todo o ser tenta se agarrar desesperadamente a ela a todo o custo. Tenho que confessar que por cada morte que passei, o tempo acabou por fazer a sua função, com mais ou menos morosidade. com mais ou menos sucesso. Não sendo excepção, também tentei me agarrar à vida e negar o inevitável. Mas de todas essas mortes apenas uma foi total. De certeza que não serei a única pessoa a quem issoa conteceu. Morri. Senti que não havia mais nada para além do que eu era. Queria permanecer assim para sempre. Mas passado uns tempos acordei. Não reencarnei, apenas acordei. Talvez tenha tido sorte em poder continuar onde tinha parado, talvez tenha tido azar por não poder parar quando não queria continuar. Mas isso também não interessa. Depois de acordar, muitas coisas tinham perdido a sua importância. Simplesmente era eu como nunca tinha sido antes. Essa experiência não fez com que me tornasse outra pessoa, apenas fez com que visse a vida e a morte com outros olhos. Sem dúvida que mudei, mas estar do lado de lá, fez-me estar em contacto com os outros que estão por lá e aperceber-me que eles não são muito diferentes dos que estão deste lado. Aliás, quem está do outro lado é porque não quer deixar o que ficou para trás.
Depois de acordar tudo era diferente e embora tivesse pegado onde tinha parado, foi como voltar a aprender a andar/ver/falar. Quando se vê o que não está à vista, quer se queira quer não se queira, isso tem um impacto nas acções e nos pensamentos de uma pessoa. O impacto é tão grande que por vezes preferia nao ter visto, ou sentido isso, preferia não ver as coisas de maneira diferente. E aproveitam-se desse facto para me usarem. Pegam no desespero que tento matar e usam-no contra mim. Pegam em tudo, no passado, presente, futuro, nas fraquezas que temos guardadas. Quanto mais confuso estiver, melhor me podem usar. Mas eu vejo. A confusão foi dissipada e o caminho foi escolhido e não são vocês que me vão impedir de o tomar. Podem me confundir momentaneamente mas cada vez será mais difícil, porque eu conheço-vos e cada vez mais tenho menos respeito por vocês.
Demónios, espírito inquietos, almas perdidas, podem entrar, a porta está aberta, sempre esteve e vocês já cá estiveram muitas vezes. Como convidados indesejados, sempre tentaram levar sem pedir. Agora sou eu que ofereço, venham porque há luz para todos. Agora sei onde acabo eu e onde começam vocês. E não será nenhum de vocês que irá apagar essa luz e não será nenhum de vocês que me irá cegar com as vossas trevas, nunca mais.
Venham, estou á vossa espera.

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